Ciência de dados e ética

Ética é uma área de estudo da Filosofia que se preocupa em resolver questões da moralidade humana. Tendo suas origens nos pensadores gregos mais antigos, a ética se preocupa em delimitar as fronteiras de conceitos tomados como antagônicos, tais como certo e errado, bom e mau, justo e injusto.

No âmbito profissional, um dos atos mais solenes que se conhece é o juramento de Hipócrates, que embasa o compromisso dos médicos para com seus pacientes. Desde o século V a.C., o texto original sofreu modificações até que, em 2017, a Associação Médica Mundial estabeleceu o Compromisso do Médico. Alguns recortes destacáveis são:

  • “guardarei o máximo respeito pela vida humana”;

  • “respeitarei os segredos que me forem confiados”;

  • “não usarei os meus conhecimentos (…) para violar direitos humanos e liberdades civis, mesmo sob ameaça.”

O juramento médico inspira um comportamento de “fazer as coisas corretamente” e “não causar danos” a seus pacientes. Na profissão de cientista de dados, cuidar dos dados é também uma atitude que perpassa os campos da ética e da moralidade. Ao lidar com dados, cruzamos as tênues fronteiras da privacidade, do viés, da orientação e do acesso à informação privilegiada. Então, uma maneira de superar dilemas éticos no mundo dos dados é estabelecer critérios de governança e seguir as melhores práticas de conformidade e legalidade.

Neste capítulo, faremos uma introdução ao tema da ética em dados, recomendando materiais para que você adquira uma formação ampliada neste tema de grande importância nos tempos atuais. Grande parte do texto são excertos de publicações sobre o tema.

Ética em dados

De acordo com Floridi e Taddeo, a ética dos dados é um novo ramo da ética que estuda e avalia problemas morais em diferentes domínios a fim de formular soluções moralmente boas, tais como condutas e valores corretos. A ética dos dados abrange

  • dados, em si, (geração, gravação, curadoria, processamento, dissemniação, compartilhamento e uso);

  • algoritmos (inteligência artificial, agentes artificiais, aprendizagem de máquina e robótica) e

  • práticas (inovação responsável, programação, hacking e códigos profissionais).

Segundo os autores,

“A ciência de dados, como a última fase da revolução da informação, está agora levando a uma mudança adicional no nível de abstração [das inquirições éticas], no qual nossa análise ética pode ser desenvolvida da maneira mais proveitosa. Em poucas décadas, passamos a compreender que não se trata de uma tecnologia específica (computadores, tablets, telefones celulares, plataformas online, computação em nuvem e assim por diante), mas o que qualquer tecnologia digital manipula que representa o foco correto de nossas estratégias éticas. A mudança da ética da informação para a ética dos dados é provavelmente mais semântica do que conceitual, mas destaca a necessidade de nos concentrarmos no que está sendo tratado como a verdadeira invariante de nossas preocupações.

A mudança no nível de abstração deu surgimento a três eixos de pesquisa: i) ética dos dados; ii) ética dos algoritmos; e iii) ética das práticas.

Ética dos dados

A ética dos dados se concentra em problemas éticos impostos pela coleta e análise de grandes conjuntos de dados e em questões que vão desde o uso dos grandes dados (big data) em pesquisas biomédicas e ciências sociais até a criação de perfis, publicidade, filantropia de dados e dados abertos. Tópicos estudados neste eixo estudam:

  • identificação de indivíduos por meio de mineração de dados;

  • vinculação, fusão e reutilização de grandes conjuntos de dados;

  • riscos de privacidade, confiança e transparência;

Ética dos algoritmos

A ética dos algoritmos aborda as questões relacionados à complexidade e autonomia dos algoritmos, especialmente os que envolvem inteligência artificial, agentes artificiais e bots da internet, bem como aprendizado de máquina. Os desafios neste eixo estudam:

  • responsabilidade moral (de designers e de cientistas de dados)

  • projeto ético e auditoria dos requisitos dos algoritmos

  • avaliação de resultados potenciais indesejáveis (discriminação, promoção de conteúdo anti-social)

Ética das práticas

A ética das práticas (incluindo a ética profissional) aborda as questões relativas às responsabilidades das pessoas e organizações responsáveis por processos, estratégias e políticas de dados, incluindo cientistas de dados, com o objetivo de definir uma estrutura ética para moldar códigos profissionais sobre inovação, desenvolvimento e utilização responsáveis, que podem garantir práticas éticas que favoreçam o progresso da ciência de dados e a proteção dos direitos de indivíduos e grupos. As questões centrais nesta linha de análise são:

  • consentimento

  • privacidade do usuário e

  • uso secundário.

A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD)

O texto a seguir é composto de excertos do Guia LGPD, produzido por Paulo Vinícius Carvalho Soares.

A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) (Lei 13709/2018), alterada pela Lei 13853/2019, tem o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural. A LGPD segue uma tendência global adotada em mais de 120 países para proteção de dados pessoais contra o uso indevido deles, especialmente por empresas. A LGPD tem os seguintes fundamentos:

  • proteção à privacidade;

  • autodeterminação informativa;

  • liberdade de expressão, informação, comunicação e opinião;

  • inviolabilidade da intimidade, honra e da imagem;

  • desenvolvimento econômico, tecnológico e inovação;

  • livre iniciativa, livre concorrência e a defesa do consumidor;

  • direitos humanos, livre desenvolvimento da personalidade, dignidade e exercício da cidadania.

A LGPD se aplica:

  • aos dados pessoais de indivíduos localizados no Brasil;

  • quando o tratamento se dá no Brasil;

  • quando houver oferta de bens e serviços para indivíduos no Brasil.

E não se aplica:

  • para dados provenientes e destinados a outros países, que apenas transitem pelo território nacional;

  • para uso pessoal ou não comercial;

  • para fins jornalísticos, acadêmicos ou de segurança pública.

Referências para aprofundamento